segunda-feira, 26 de abril de 2010

Ei cara, me leva pra lá!

O sexto encontro daquele grupo começou com rápida e confusa explanação de um certo militar sobre a luz de lampião em comparação a luz de lampada elétrica. Ele falou do tempo que se modifica por causa do tipo de iluminação, ou seja, o tempo é mais devagar quando iluminado pela luz de uma chama, e que o tempo se acelera quando iluminado por um filamento incandecente a partir da eletricidade. Depois da explanação do militar, uma moça muito espevitada comparou a velocidade do tempo em comparação as épocas em que se utilizava a luz de chama, de quando as freiras ainda não eram santas, e sim somente humanas. Então a mulher que comandava o grupo fez com que 3 casais meio trocassem experiência meio que estranhas. Nesse momento surgiram espectros de rapazes sem olhos, aranhas que se tranformaram em cavalo deante de nossos olhos, bonecas que piscavam os olhos sem parar, meninas que pulavam janelas gigantes, anéis de serpente, homens de branco que se confundiam à muros, orixás e caboclos e médiuns que psicografam histórias passadas. Até que uma dessas entidades pediu a uma moça: ei cara, me leva pra lá!

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Sentido apático...


Era o quinto encontro daquele grupo e começou como sempre começara: com a explanação de um dos jovens sobre algum determinado assunto. Porém naquele dia, a linda jovem que iria explanar e o dileto rapaz que iria tecer comentários acerca da explanação da moça, se atrasaram para a reunião, o que causou grande tensão e medo, pois a mulher ameaçou fazer malvadezas com os demais jovens caso os dois não chegasse. Felizmente eles chegaram. A bonita jovem falou dos cheiros, aroma e odores que permeiam a nossa vida. E que apesar de não se dá a devida atenção a eles, ainda sim eles ativam a parte do corpo que se vem trabalhando a algum tempo: a memória. E que ele juntamente com os sabores, sons, imagens e texturas, têm o estranho poder de remeterem a campos muito familiares e agradáveis, ou às vezes muito desagradáveis ainda que bem conhecidos. Mas que ainda sim são memórias sinceras. Então o dileto rapaz fez uma relação com alguns momentos que havia passado em sua meia-vida: quando entrou em banheiros alheios cheios de detergentes e água suja pelo chão, quando assistiu sessões estranha de defumação enquanto homens ofegantes corriam ao seu redor, e de quando foi convidado a participar de uma orgia de frutas e vinhos despejados por corpos nus. Então a mulher como sempre fazia, usou de palavras mágicas para conduzir um dos casais, após uma mísera semana de matrimônio, a uma espécie de "terapia de casal". O marido deveria discutir com alguém imaginário, e assim colocar para fora suas angústias freudianas que poderiam fazer uma esposa sofrer. A esposa por outra lado, deveria contar ao marido histórias secretas de sua estirpe, afim de que não guardasse segredos do marido que pudessem o levar a desconfianças infundadas. Nesse contexto, era e foi, inevitável, a tristeza, a emoção e as lágrimas evidentemente. O despejo de angústias misturadas aos segredos desencadearam numa bomba sentimental que logo explodiu num longo e confortável abraço, selando mais uma vez o matrimônio. Estava terminada a terapia, e por conseguinte os problemas passionais. Uma moça, já meio alterada, não sabendo dominar seus poderes, tomou para si todo o tipo de tristeza e emoções que por ali passaram. E quase explodiu em revolta não fosse um rapaz muito pró-ativo que excomungou todos os fantasmas na forma de sentimentos que queriam acometer a moça. Livrada do mal, a moça voltou a se parecer como todos os demais integrantes da reunião: sendo dominados não mais pelos sentidos de visão, audição, paladar, tato, olfato, háptico; mas sim pelo mais desconhecidos dos sentidos: o sentido apático...

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Ei cara, relaxa...


No quarto encontro daquele grupo, como nos dois último encontros, começou com jovens integrantes tomando a frente da assembléia, porém dessa vez não foi um só, mas sim dois integrantes. Eles falaram de uma certa crise em nossos sentidos. Disseram que essa crise é na verdade uma doença, uma peste, assim como a peste da insônia que Garcia Marques descreveu em "Cem anos de solidão" (citada na terceira reunião) e a peste do nazismo que se espalhou pela Alemanha entre as décadas de 30 e 40. A peste da anestesia, esssa doença que foi se espalhando até tomar conta de toda população. Essa doença é trazida pelo contato com os aparelhos tecnológicos que são seu reservatório natural e também seu vetor de transmissão. Os piores sintomas são a perda dos sentidos (principalmente tato e olfato) ou o condicionamento para uma percepção restrita (visão, paladar e audição). Até que o doente se encontre imerso em um mundo familiar bombardeado de imagens pré-estabelecidas trazidas pelos aparelhos tecnológicos, enquanto o mundo lá fora se esfumaça e se esvai cada vez mais, até tornar-se algo distante ou inatingível. Duas moças que estavam completamente tomadas por essa peste, não resistiram à doença e desapareceram. Então todos os outros, inclusive a mulher que conduzia as reuniões, preocupados com o grau de contaminação da peste, discutiram em que estágio da doença se encontravam, o que poderiam fazer para se curar e como fazer para levar a cura à outros. Alguns momentos antes, os dois jovens aprendizes que estavam ao centro da assembléia, tentaram realizar uma espécie de mágica, incutiram composições imagéticas na mente de todos ali presentes da manifestação mais grave da peste do nazismo: a intolerância. Um dos participantes se sentio extremamente imcomodado com as imagens que lhe foi projetado à suas vistas. Ele estava curado da anestesia. Então a mulher mais uma vez usando de seus poderes fez com que os participantes se unissem num matrimônio intermitente, que só duraria aquela noite. E os casais, como num primeiro encontro, somente se entregaram aos braços um do outro. Alguns poucos sentiram-se tensos, enquanto outros mais ficaram até bem relaxados. Uma voz secreta soprou ao ouvidos dos aflitos "Ei cara, relaxa...", e tudo voltou a ser mansidão.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Não gosto de discussões que não levam a nada...


Era a terceira vez que aquele grupo se reunia. Começou a assembléia com uma moça muito bonita falando sobre memória, exatamente o mesmo tema em que se encerrou na última reunião. Ela falou de um fato físico facilmente explicável que é o tempo encurtado nos dias de hoje, que com o passar do tempo o dia perdeu muitos minutos e algumas horas. Porém, mesmo sabendo-se disso, a sociedade ainda acredita hipocritamente que o dia ainda tenha 24 horas, quando se sabe é claro que o dia passou durar somente 19 horas e 27 minutos. Então moça bonita falou de um certo exercício mágico ancestral, que podia fazer o tempo voltar a ser mais lento, e o dia voltar a ganhar 24 horas, sendo possível ganhar até mais que 24 simples horas, chegando mesmo ao infinito de horas. Era um exercício dos ancestrais deles, de mexer numa determinada parte do corpo que haviam parado de mexer, a memória, e que quanto mais se toca nela, seja a memória pessoal, a memória pessoal de outro, ou a memória de uma época, mais o tempo passava devagar. Então depois disso, uma rapaz muito magro e tímido tomou o centro da assembléia e disse que uma amiga sua havia feito esse exercício com as memórias de uma tia dele, e ele afirmou piamente que o exercício funcionara. Depois ele lembrou que também já havia feito esse exercício em um grupo de pessoas para lembrar uma época muito especial daquela mesma tia dele, e que também havia funcionado. Então um outro rapaz, de aparência muito familiar, explanou sobre a utilização da mágica memória para a formação da identidade de determinados povos. Um outro rapaz mostrou um exemplo prático de como a memória formou a identidade de uma população de uma cidadezinha que era composta de somente três habitantes. Então a senhora mais velha que sempre conduzia aquele grupo, como nas últimas reuniões, fez uso de seus poderes mágicos e conduziu o corpo dos demais participantes somente pelo comando de voz. Ela os fez repetir involuntariamente gestos que eles fazem em momentos muito sercretos, como trocar de roupa e tomar banho, e os fez repetir tantas vezes e cada vez mais rápidos, que o gesto se tornou algo grotesco, algo fora do corpo daqueles jovens, como se cada um deles fosse únicos e ao mesmo tempo muitos. De modo que aquelas personalidades entrassem num inevitável conflito, numa repentina discussão e que não os levaria a lugar nenhum que não fosse para as suas próprias casas.

É muita narrativa enviesada...

Uma segunda vez aquele grupo de pessoas se encontrou para conversar e fazer trocas que resultassem numa espécie de experimento. Um rapaz muito sábio, se levantou primeiro, e fez toda uma contextualização histórica de forma primorosa, porém foi sentido que lhe faltou algo mais substâncial, algo mais objetivo, para que pudesse se fazer entender daquilo que havia estudado, mas mesmo assim ele o fez na sua postura mais séria, o que o fez merecer tantos aplausos. Depois uma mocinha muito comportada, sentou-se ao meio da conferência, e fez o estranho exercício de mostrar na prática-falada, o que o rapaz havia tentado explanar. Mas ela falou de experiências pessoais para demonstrar o que estava falando. Então uma forte luz se ascendeu. Só então o grupo foi compreender do que se tinha falando, falava-se de histórias: histórias dos semelhentes, histórias de pessoas, histórias humanas. Histórias entrelaçadas umas as outras dentro de um único contexto bastante expressivo, feita de fragmentos e cacos de outras tantas histórias. Então a mulher que sempre conduzia aquela esquisita experiência, se usou de algumas palavras de poder e magia, e fez que todos os mais jovens, meio que involuntáriamente, voltasse a reviver uma pequena cena-memória-fotografia-relance do seu passado pueril naquele mesmo lugar, de modo que seus corpos recordassem um tipo de registro que nem sabiam que tinham, de modo que entrassem numa espécie de transe coletivo, de memórias entrelaçadas, mesmo que em passados diferentes, de modo que passassem a dividir o mesmo lugar comum em ações gritatemente estranhas e desconexas, de modo que os próprios jovens assumissem o controle um dos outros por meio de voz ou da própria sensibilização mental, de modo que passasem a passear por territórios muito secretos um dos outros, de modo que estavam brincando com o ouro e sangue uns dos outros. Isso, mesmo com jovens inexperientes, filhos de uma pátria de lembranças perdidas, e distantes de uma terra de promissões futuras, não é correto. E justamente por isso, um jovem tímido e franzino, não quis se propor aos exercícios, pois não se sentia preparado para entrar em campos tão obscuros e perigosos como o da própria memória. Isso porque, nem todos querem se enviesar por teias de narrativas que podem esmagar a razão e dilacerar um coração.
 
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